Bingo

Atividade dinâmica em que os participantes conhecem as letras, números, acentos e ainda leem os textos das cartelas como prêmio final

Contação de Histórias

Momento em que todos aprendem a ouvir, refletir e interpretar

Produção de HQ

Confecção de Histórias em Quadrinho

Cineclube Riacho do Navio

Sessão de filmes exibidos ao ar livre no anfitetro localizado no município de Piranhas em Algoas

Sussurrador de Textos

Ferramenta ultilizada para leitura e compreenção de textos

Palavrices

Atividade realizada com macarrão de letrinhas para o estímulo da leitura, escrita e ortografia do sujeito

Pescaria

Atividade desenvolvida com frases estratégicas e de trava-língua para o desenvolvimento da leitura

terça-feira, 27 de novembro de 2018

Lá li gibi expande suas fronteiras e promove a estante ambulante no Janga.

Nenhum texto alternativo automático disponível.
Logomarca da Estante Ambulante


Imagine uma biblioteca cuja ação sugere ir além de seus limites físicos. 

É isto que o projeto Lá Li Gibi põe em prática, ao levar parte do acervo pertencente à Biblioteca Popular Riacho do Navio a espaços em que haja possibilidade do exercício da leitura. 

Um exemplo é a chegada da ação intitulada 'Estante Ambulante' na Lanchonete Dona Lara, situada no Janga, bairro da cidade de Paulista, pertencente à Região Metropolitana do Recife. 

Este bairro possui cerca de 44mil habitantes, mas não conta com equipamentos de cultura e lazer como teatro, cinemas, biblioteca pública e até livrarias.

Pensando em contribuir para a redução deste déficit instalamos uma estante com gibis e livros de literatura permite aos clientes uma opção de entretenimento, enquanto esperam pelo seu lanche. Também é franqueado aos clientes o empréstimo de obras da estante, para que possam continuar a leitura em casa.

Porque para nós, a leitura é um prato cheio!











segunda-feira, 14 de maio de 2018

CINECLUBE RIACHO DO NAVIO FAZ VALER A LEI 13.006/2014 EM ESCOLA PÚBLICA DE JOÃO PESSOA



Imagine um projeto cuja proposta é realizar sessões de cinema em uma escola pública.
Não é preciso fazer um complexo exercício de imaginação para visualizar situação como esta.
Você acredita que se cobram ingressos para estas sessões?
No entanto, antes de imaginar a monetarização desta cobrança, pense que muitas são as possibilidades...
Neste caso, o ingresso cobrado é o empréstimo de livro ou gibi na biblioteca escolar, sendo as obras devolvidas no momento da sessão de cinema.
É isto que o projeto de extensão Lá Li Gibi/UFPB vem realizando em parceria com a Escola Municipal de Ensino Fundamental Virgínius da Gama e Melo, localizada no bairro de Mangabeira.
  Com essa proposta pomos em prática as leis 13.006/2014 e 12.224/2010Especialmente, utilizamos a garantia do direito ao acesso à produção cultural brasileira, traduzida pela 7ª arte (cinema), e a dinamização do setor de empréstimo de obras do acervo da biblioteca escolar, para estimular o desenvolvimento do hábito da leitura.
Neste ano de 2018, a primeira ação do Cineclube Riacho do Navio (este é o nome da atividade) na escola aconteceu nos dias 24 e 26 de abril e teve como tema "Eu e o meu lugar".
Para a abordagem deste tema foram exibidos filmes "A fábula da corrupção" e "A menina espantalho". O encerramento das sessões foi apresentado o clipe "Mangabeira", um rap composto e cantado pelo músico paraibano Pertnaz.
Cartaz de divulgação
Com o tema ‘Eu e o meu lugar’ buscamos levantar a construção da individualidade do ser humano e o seu papel no mundo sob as perspectivas da ética, do exercício de direitos fundamentais e do reconhecimento do espaço físico no qual circulamos como deflagrador de convivências e produtor de cultura e saberes.
Nas duas datas assinaladas ocorreram sete sessões, sendo três no turno da tarde do dia 24 e quatro no turno da manhã do dia 26, o que proporcionou a participação de mais de 300 estudantes da escola.
Sessão do dia 24/04
Segundo uma funcionária que organiza a biblioteca escolar, o aumento do número de empréstimos de obras do acervo foi expressivamente maior do que de costume.
E é isto o que objetivamos: dinamizar a frequência à biblioteca escolar, aumentar o número de obras em circulação proporcionada pelo correspondente aumento de obras emprestadas, proporcionar meios que contribuam com o desenvolvimento do hábito da leitura e democratizar o acesso à produção cinematográfica nacional.
Nesse mês de maio o tema será "Se a coisa tá preta, a coisa tá boa!", objetivando a reflexão de que a Lei Áurea, instituída em 13 de maio de 1888, não aboliu a escravidão no Brasil, sendo este um dia necessário à discussão do racismo estrutural presente em nosso país.
Cartaz de divulgação

terça-feira, 14 de novembro de 2017

14 DE NOVEMBRO - DIA NACIONAL DA ALFABETIZAÇÃO (?)



DIA NACIONAL DA ALFABETIZAÇÃO E ANALFABETISMO NO BRASIL
Autora: Judy Rosas

 
No ano de 1966, o dia 14 de novembro foi definido como o dia nacional da alfabetização. Em 1967 foi criado o dia mundial da alfabetização, pela  ONU e a UNESCO: 8 de setembro.

No entanto, é o analfabetismo que salta aos nossos olhos quando tratamos desta questão.

Em 1940, de acordo com o Censo Demográfico (IBGE), havia no Brasil 13.269.000 pessoas com 15 anos e mais na condição de analfabetas. Hoje, praticamente não conseguimos superar tal situação. 
Esta é a real estagnação do analfabetismo no Brasil: em 77 anos observamos a sua manutenção, o que indica que é na própria escola que o analfabetismo tem sido forjado.

O que temos, portanto, a comemorar no dia de hoje? A persistente analfabetização das pessoas? A competência da escola pública no Brasil em reproduzir o analfabetismo? Ou a espantosa configuração do eleitorado brasileiro, que tem quase a metade formada por pessoas analfabetas absolutas ou funcionais (como demonstra o quadro que segue)?
O fato é que entre a Independência (7 de setembro)  e a República (15 de novembro), no Brasil do século XXI, ainda nem alcançamos uma das bandeiras cunhadas no iluminismo e que é, portanto, pré-capitalista: educação para todos.

    Nossa independência é uma piada de mau gosto. E a república... 
    Precisa completar?






segunda-feira, 6 de novembro de 2017

CINECLUBE RIACHO DO NAVIO: LEITURA E CINEMA NA BIBLIOTECA

CINECLUBE RIACHO DO NAVIO: LEITURA E CINEMA NA BIBLIOTECA[1]
Giovanna Costa de Vasconcelos

RESUMO

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional Nº9394/96 considera a exibição de filmes nacionais como “componente curricular complementar integrado à proposta pedagógica da escola, sendo a sua exibição obrigatória por, no mínimo, 2 (duas) horas mensais”. Tal aspecto, no entanto, só foi incluído, ao ser sancionada a Lei Nº 13.006/14, que regulamenta tal obrigatoriedade. Por considerar a importância do acesso à produção artístico-cultural brasileira às maiorias populacionais, e ao observar o desconhecimento de expressiva parcela de pessoas envolvidas com a educação escolar acerca da existência de tal lei, formulamos um projeto denominado Cineclube Riacho do Navio. Este constitui uma das atividades da Biblioteca Popular Riacho do Navio, localizada fisicamente na cidade sertaneja de Piranhas-AL e que, no entanto, funciona de modo itinerante, pois entendemos que a biblioteca, para cumprir a sua função de equipamento disseminador de conhecimento, cultura, entretenimento e convivências, deve extrapolar os seus limites físicos e ir aos lugares onde estão as pessoas não leitoras. Com apoio da gestão da Escola Municipal de Ensino Fundamental Virgínius da Gama e Melo – localizada no bairro de Mangabeira, em João Pessoa – são exibidos filmes brasileiros de curta metragem para alunos do 6º ao 9º anos e para turmas de EJA 3º e 4º ciclos. Ao por em prática o que preconiza a Lei Nº13.006/14, inferimos sobre: I- a importância do audiovisual como estratégia para promover debate acerca de temas importantes para a compreensão da realidade; II- o reconhecimento do cinema enquanto uma arte que pode estimular o hábito da leitura, quando, pelo encantamento que provoca, lança às pessoas expectadoras o desafio de ampliar o conhecimento sobre os problemas e temas desenvolvidos nos filmes; III- a íntima relação que se pode estabelecer entre cinema e biblioteca (destacadamente, neste caso, a biblioteca escolar), tendo em vista a formação do leitor. Com sessões mensais, nas quais distribuímos questionário avaliativo acerca da atividade, dos filmes apresentados e solicitando sugestões de temas para a sessão do mês seguinte, constatamos a atenção das pessoas, cujo quantitativo a cada mês aumenta em responderem ao questionário. Os professores das turmas participam das sessões e procuram estimular o debate acerca de cada filme. Consideramos que tal ação cineclubista tem atingido não só os alunos e alunas, mas também tem se mostrado uma alternativa pedagógica a ser incorporada nas diversas disciplinas. Apesar de não termos ainda posto em prática, é nossa intenção ‘cobrar’ o acesso às sessões de cinema, condicionando a entrada dos discentes ao empréstimo de algum livro ou história em quadrinhos disponíveis no acervo da biblioteca escolar. Consideramos que tal prática poderá estimular a frequência a bibliotecas e o desenvolvimento do hábito da leitura.


[1] Trabalho apresentado na sessão de comunicação oral durante o ‘Simpósio Letramentos Para a Cidadania – LECID’, realizado de 30 de outubro a 1 de novembro de 2017, na Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE).






ANALFABETISMO E DESENVOLVIMENTO NO PERÍODO DE INTRODUÇÃO DO NEOLIBERALISMO NO BRASIL

ANALFABETISMO E DESENVOLVIMENTO NO PERÍODO DE INTRODUÇÃO DO NEOLIBERALISMO NO BRASIL


Texto publicado em:  ADUFPB-Secção Sindical do ANDES-SN. Revista Conceitos, v.2, n.25, janeiro/junho de 2017, João Pessoa. Disponível em:  <https://issuu.com/adufpb/docs/revista_conceitos-ed-25-ou-2017>. p.12-24.

Autora: Judy Mauria Gueiros Rosas

RESUMO

Enfocamos a implementação da principal proposição política para o controle do analfabetismo deflagrada no primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso, no sentido de compreender a sua atualidade, tanto enquanto política social, como situada no neoliberalismo. Este, se então era uma novidade, presentemente revela-se vigoroso e em expansão. A proposição de conter o analfabetismo entre os jovens de até 29 anos revela o caráter restrito e pontual da ação. Ao mesmo tempo assistimos a transferência de funções estatais para a iniciativa privada, sob o discurso particularista de que cada pessoa deveria fazer a sua parte, para ajudar aquelas excluídas socialmente.
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Palavras chave: Neoliberalismo. Analfabetismo. Capital.


ABSTRACT

We focus on the implementation of the main political proposal for the control of illiteracy triggered by the first government of Fernando Henrique Cardoso, in order to understand its relevance as social policy in neoliberalism. Then, if it was a novelty, is now proving to be vigorous and expanding. The proposal to contain illiteracy among young people up to 29 years of age reveals the limited and punctual nature of the action. At the same time we see the transfer of state functions to the private initiative, under the particularist discourse that each person should do his part, to help the socially excluded people.
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Key words: Neoliberalism. Illiteracy. Capital



      A história segue sempre, em tempos e lugares, a passos tão lentos que aquilo que julgamos pertencer aos domínios do passado, numa aparência repentina, salta, diante de nós, com a força das novidades e com a segurança do que há muito se consolidou sem que tivéssemos percebido.
É este o atual cenário da condução da política e da economia no Brasil, e de suas necessárias ferramentas voltadas à obtenção do convencimento, da adesão e do controle da população a proposições cujo teor aponta, especialmente, para a precarização do mundo do trabalho e a perda de direitos constitucionalmente obtidos.
      Esta sensação de déjà vu revela que o movimento iniciado na primeira metade dos anos 1990, com a eleição de Fernando Henrique Cardoso a presidente do país, longe está de ser concluído. Retomar a discussão a partir daquele ponto talvez nos seja necessário para que compreendamos o ainda inconcluso processo de consolidação dos ideais neoliberais no Brasil.
      Tomar como referência para esta discussão o tratamento dado ao problema do analfabetismo no Brasil se justifica pela desconcertante proposição do governo assinalado de não superar tal situação, como apresentaremos ao longo do texto que ora iniciamos. Para tanto, enfocaremos o tratamento do analfabetismo no Brasil, com a inauguração e a implementação do Programa Alfabetização Solidária.
      E não nos ateremos à particularidade deste programa e à mera discussão relacionada à eficiência e à efetividade sobre este divulgada. O processo de inserção do Brasil ao neoliberalismo fornece o conteúdo e o modo como tal política se expressou.
      Devemos considerar primeiramente que esta reorientação do capital foi inaugurada de modo tardio no Brasil. Em países do capitalismo central, já em fins dos anos 1970, o novo ritmo com que as mudanças no processo de produção, que a chamada “revolução informacional” propiciava, ao lado do fortalecimento do capital financeiro, exprimiam como matriz cultural e ideológica uma ofensiva sem precedentes.
      A automação fabril inaugurava um novo tipo de relação de produção pautada na crescente substituição do trabalhador por máquinas ‘inteligentes’ e implicava numa ampla difusão de novidades perturbadoras, como o fim do trabalho, o fim da história e, consequentemente, o fim da luta de classes.
      No Brasil, foi nos anos 90 do século XX que as forças dominantes brasileiras inauguraram e conduziram a política e a economia mais nitidamente nos moldes neoliberais, cujas características centrais são: grande expansão do mercado financeiro, personificação do mercado em detrimento do poder dos trabalhadores, produção de um retrocesso social e privatização das empresas e de funções estatais, associados à precarização das relações de trabalho, que liquidam a luta sindical (MOTA, 2000).
      Além disso, observamos uma forte tendência a explicar a existência do fenômeno da pobreza enquanto uma inadaptação dos explorados à lógica do mercado. Isto porque, no neoliberalismo, o termo miséria, foi substituído pela expressão ‘exclusão social’.
Esta mudança na terminologia concorreu para adequar uma proposição central à ordem do capital, que é a reprodução da sociedade dos indivíduos livres e isolados, cujas desigualdades são diluídas e suas sequelas transferidas para o sujeito que se excluiu, tornando iguais os que diferente e desigualmente reproduzem sua existência.
      Ou seja, a desigualdade, da qual uma de suas expressões é o analfabetismo, tem sua gênese numa suposta liberdade de opção do sujeito por se escolarizar ou não, visto que, inclusive constitucionalmente, a educação é um direito subjetivo. De modo similar, faz-se acreditar que o desemprego é um fenômeno que afeta os menos competitivos, principalmente por serem menos escolarizados e, portanto, menos qualificados.
      Assim, afirmamos que as proposições para a escolarização de homens e mulheres durante o período enfocado no Brasil obedeceram a uma orientação que apontava para além das fronteiras nacionais, principalmente a partir da criação de mecanismos que desqualificavam o trabalho e os sujeitos que o realizavam.
      Não podemos olvidar, entretanto, que a implantação do neoliberalismo, que ocorreu em quase toda a América Latina, reclamou a viabilização de reformas necessárias à sua consolidação. E a reforma do Estado constituiu a ponta de lança deste reordenamento.
No Brasil, o ponto de partida das reformas requeridas foi a criação, ainda no primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso (FHC), do Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado (MARE), sob a batuta do então ministro Bresser Pereira.
      Ao propor uma ‘superação’ da forma burocrática que engessava e tornava ineficientes as ações da administração pública, e a sua substituição por um modelo gerencial que tornasse mais ágil a ação estatal, foi elaborado o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado (PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA, 1995).
      Tal plano instituiu o estabelecimento da separação entre o que se entendia por “setores estratégicos” e “atividades exclusivas do Estado”, no sentido de viabilizar um modelo de “publicização” das atividades que careciam de maior eficiência e qualidade – critérios então considerados fundamentais ao gerenciamento estatal, e do qual emergem 3 tipos de propriedade: propriedade privada, propriedade pública estatal e propriedade pública não estatal.
      À propriedade privada correspondiam os setores comprometidos com o fornecimento e a produção de bens e serviços para o mercado, tais como as empresas de economia mista em setores estratégicos ou de serviços públicos.
      Era a propriedade pública estatal o núcleo estratégico composto pela Presidência da República, Ministérios de Estado e Tribunais Federais, cujas atividades eram exclusivas do Estado, a saber: os poderes relacionados à tributação e à legislação, às forças armadas e à polícia e às instituições reguladoras e fiscalizadoras.
      De acordo com Bresser Pereira (1998), seriam propriedade pública não estatal as “instituições de direito privado voltadas para o interesse público e não para o consumo privado” (p.262), de modo que houvesse um sistema de parceria entre Estado e sociedade. Assim, o recebimento de subsídios estatais pelas organizações sociais de interesse e utilidade pública (OSIP) implicaria no consumo privado dos recursos e consumo público dos serviços que lhes fossem designados.
      Era este é o sentido da publicização, a ‘brilhante’ saída para dar continuidade ao financiamento público de instituições privadas ou alguns setores da administração pública que deveriam tornar-se autônomos em relação ao Estado, como serviços sociais, culturais, de proteção ambiental, de pesquisa científica e tecnológica (BARREYRO, 2006).
      A necessidade de conferir amparo legal a esta proposição propiciou a criação do Programa Nacional de Publicização, a partir do qual foi promulgada a Lei nº 9790, de 23 de março de 1999, que regulamentou as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), qualificadas como:
                                                       
(...) Pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, desde que os respectivos objetivos sociais e normas estatutárias atendam aos requisitos instituídos por esta Lei. § 1o Para os efeitos desta Lei, considera-se sem fins lucrativos a pessoa jurídica de direito privado que não distribui, entre os seus sócios ou associados, conselheiros, diretores, empregados ou doadores, eventuais excedentes operacionais, brutos ou líquidos, dividendos, bonificações, participações ou parcelas do seu patrimônio, auferidos mediante o exercício de suas atividades, e que os aplica integralmente na consecução do respectivo objeto social (ART.1º).


      Sobre as finalidades das OSCIPs, o Artigo 3º desta lei determina que estas devessem obedecer pelo menos uma das atividades listadas:
                                  
I- promoção da assistência social; II- promoção da cultura, defesa e conservação do patrimônio histórico e artístico; III- promoção gratuita de educação, observando-se a forma complementar de participação das organizações de que trata esta Lei; IV- promoção gratuita da saúde, observando-se a forma complementar de participação das organizações de que trata esta Lei; V- promoção da segurança alimentar e nutricional; VI- defesa, preservação e conservação do meio ambiente e promoção do desenvolvimento sustentável; VII- promoção do voluntariado; VIII- promoção do desenvolvimento econômico e social e combate à pobreza; IX- experimentação, não lucrativa, de novos modelos sócio-produtivos e de sistemas alternativos de produção, comércio, emprego e crédito; X- promoção de direitos estabelecidos, construção de novos direitos e assessoria jurídica gratuita de interesse suplementar; XIX- promoção da ética, da paz, da cidadania, dos direitos humanos, da democracia e de outros valores universais; XII- estudos e pesquisas, desenvolvimento de tecnologias alternativas, produção e divulgação de informações e conhecimentos técnicos e científicos que digam respeito às atividades mencionadas neste artigo. Parágrafo único. Para os fins deste artigo, a dedicação às atividades nele previstas configura-se mediante a execução direta de projetos, programas, planos de ações correlatas, por meio da doação de recursos físicos, humanos e financeiros, ou ainda pela prestação de serviços intermediários de apoio a outras organizações sem fins lucrativos e a órgãos do setor público que atuem em áreas afins. 

                  
      Tais serviços, no entanto, não se pautavam na perspectiva de auferir ao público a ser atingido pelas políticas a garantia de direitos previstos constitucionalmente, mas como resultante da ação de cidadãos que solidariamente exerciam a filantropia como forma de cuidar daquelas pessoas incapazes de, por si, proverem sua existência nos mínimos patamares.
      Outra novidade que imediatamente atingiu o conjunto da população foi instauração de um plano econômico cujas características básicas foram a sobrevalorização do câmbio pelo barateamento dos produtos importados, o encarecimento dos produtos nacionais e a consolidação da abertura comercial e financeira do Brasil aos países do capitalismo central.
      Este plano, sob a justificativa de controlar a inflação, surtiu, na verdade, dois efeitos. Em 1994, a balança comercial brasileira colocava o país como o 3º maior comércio do mundo. Logo após, em 1998, confirmou-se um déficit de 8,5%, acompanhado de perto por um déficit na balança de serviços (1).
      Foi também nos oito anos de governo FHC que se consolidou um movimento de privatização de estatais sem precedentes na nossa história.
      O fato é que este governo sedimentou a inclusão do neoliberalismo no país, sob o consentimento da maioria da população que o elegeu e acreditava (e, hoje, parece que continua a acreditar!) ser possível o estabelecimento de parcerias entre trabalho e capital.
      Os resultados desse pacto foram principalmente o desemprego, a precarização do trabalho – desencadeada pela proclamada flexibilização das relações trabalhistas e pelo desestímulo à organização dos trabalhadores –, além da perda de significativa parcela do patrimônio público nacional.
      A farta propaganda sobre os benefícios do governo para com a população pobre e a larga utilização de expressões como “parceria”, “solidariedade”, “trabalho voluntário” delinearam o perfil das políticas sociais, também marcadas pela transferência monetária, a exemplo do Programa Bolsa Escola, que concedia uma bolsa de R$ 15,00 (quinze reais) a cada criança em idade escolar que estivesse frequentando a escola, observando o limite de três bolsas por família, perfazendo um máximo de R$ 45,00 (quarenta e cinco reais).
      Segundo propaganda então amplamente divulgada em emissoras de rádio e televisão, as famílias contempladas com tal auxílio – famílias cuja renda familiar mensal por indivíduo fosse de até R$ 90,00 (noventa reais) – teriam adquirido poder para comprar comida, roupas, remédios, material escolar e, assim, teriam aumentado sua capacidade de consumo.
      O fato é que à época do lançamento do Programa Bolsa Escola o salário-mínimo, que havia sido aumentado de R$ 161,00 (cento e sessenta e um reais) para R$ 180,00 (cento e oitenta reais), dada a sua exiguidade, expunha, mesmo àqueles não sensíveis à causa da exploração, a necessidade de executar políticas de complementação de renda, com o intuito de controlar os riscos que a superexploração de homens e mulheres impunham.
      Em verdade, o que se pôde observar foi o deslocamento da abordagem da pobreza dos âmbitos político e econômico ao de problema técnico e filantrópico.
      O flagrante abandono das questões cruciais que envolviam a maioria da sociedade, neste contexto, foi mascarado sob a orientação de que cada um deveria fazer a sua parte; prática essa viabilizada pelo estímulo a ações voluntárias associadas ao suposto despertamento do espírito solidário que todos os brasileiros deveriam ter pelos ‘necessitados’, ‘carentes’ e ‘excluídos’.
      Houve, neste momento, um significativo impulso em relação ao surgimento e fortalecimento de Organizações Não Governamentais (ONGs) e fundações que, como previsto no Programa Nacional de Publicização, passaram a atuar em substituição à ação estatal. Segundo Montaño (2002), esta transferência de responsabilidade teve caráter político-ideológico cujos objetivos se pautaram por
                                                  
Retirar e esvaziar a dimensão de direito universal do cidadão quanto a políticas sociais (estatais) de qualidade; criar uma cultura de autoculpa pelas mazelas que afetam a população, e de autoajuda e ajuda mútua para seu enfrentamento; desonerar o capital de tais responsabilidades, criando, por um lado, uma imagem de transferência de responsabilidades e, por outro, a partir da precarização e focalização (não universalização) da ação social estatal e do ‘terceiro setor’, uma nova e abundante demanda lucrativa para o setor empresarial (p.23).

      A opção estatal para o tratamento privado da pobreza, pela via da transferência de suas atribuições a ONGs, proporcionou o escoamento de recursos financeiros cujos verdadeiros beneficiários foram os filantropos da hora.
      Podemos afirmar então que houve, neste período, um movimento de fomento ao particularismo, que pôs a responsabilidade sobre os indivíduos que deveriam agir de modo a ajudar ao próximo. Destacamos ainda como exemplo o chamamento do governo central à população, que deveria assumir o papel de “Amigos da Escola”, para suprir os déficits de pessoal e a precariedade das condições de funcionamento nas escolas, supostos motivos apontados como promotores da violência e da suposta improdutividade escolar.
      O resultado disso foi a desqualificação das lutas por direitos sociais associada a uma fragilização da organização popular e de trabalhadores. Além disso, o trabalho voluntário muito mais serviu para reduzir a oferta de vagas de emprego que como instrumento de redução dos déficits gerados na sociedade de desiguais.
      Mais: disseminou-se a cultura de que cidadania seria coincidente com filantropia. Criou-se a onda de voluntariado de um modo jamais experimentado no Brasil. Esta tendência adentrou o Século XXI e hoje conta com a adesão de significativa parcela da sociedade.
      Segundo Yasbek, no ano de 2003 havia no país 19 milhões e 700 mil voluntários, o que correspondia a uma redução da oferta de 333 mil postos de trabalho de 40 horas de jornada semanal (2).
      Obedecendo à mesma lógica da terceirização das políticas sociais foi criado o Programa Comunidade Solidária. Inicialmente ligado à distribuição de cestas básicas e, mais tarde, devido às críticas recebidas, priorizou “o fortalecimento da sociedade civil”, a partir da promoção do voluntariado e apoio a ONGs e o “desenvolvimento de programas inovadores” (BARREYRO, 2006, p.3) como Universidade Solidária, Capacitação Solidária e Alfabetização Solidária (programa que propunha tratar a questão do analfabetismo), financiados pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).
      A política do BID para toda a América Latina previa o ‘fortalecimento’ da sociedade civil a partir da instauração de novas formas de prestação de serviços sociais por governos locais – às quais chamavam de descentralização – e pela promoção da filantropia e do voluntariado. Como contrapartida era fornecido às instituições privadas parceiras o Certificado de Fins Filantrópicos e o Certificado de Utilidade Pública Federal, que lhes garantiam isenção de impostos.
      Podemos apreender, portanto, que esta reforma do Estado tratou de engordar, com recursos públicos, setores capitalistas que foram duplamente beneficiados, tanto com financiamento direto como indiretamente, sob a forma da isenção de impostos.
      A participação da sociedade se deu pelo fortalecimento e reconhecimento de que a ação solidária teria natureza individual, no sentido de que cada pessoa voluntária estaria fazendo a sua parte ao se integrar em ações que, antes de qualquer coisa, a faria mais feliz por fazer outros felizes.
Assim, o sentido da filantropia e da ajuda comungou com os interesses do capital, retirando a componente de luta e de militância política por emancipação coletiva.
      Sobre o Programa Alfabetização Solidária, afirmamos que este foi criado no interior do MEC e desencadeado sob a coordenação da primeira dama, a socióloga Ruth Cardoso. Seu objetivo principal seria atingir jovens e adultos analfabetos de 14 a 25 anos, a partir do estabelecimento de parcerias entre governos, iniciativa privada e pessoas físicas.
        Criado em 1997, pelo Conselho da Comunidade Solidária, constituía
                                                  
Um fórum de desenvolvimento de ações sociais cuja base de funcionamento é a parceria entre governo federal, iniciativa privada e sociedade civil [...] tem como objetivo reduzir os índices de analfabetismo no Brasil e de expandir o acesso de jovens e adultos à educação nos municípios que apresentam os índices mais elevados de analfabetismo no país (ESTEVES, 2002, p.01).

      Para tanto, propunha a sua materialização a partir da formação de módulos de alfabetização com duração de 6 meses, organizados em turnos de 3 horas diárias em 4 dias por semana. Desses 6 meses, um mês seria dedicado à capacitação de alfabetizadores leigos, preferencialmente moradores das comunidades em que o programa deveria ser implantado. A coordenação central das ações, em cada comunidade, coube a Instituições de Educação Superior (IES), principalmente da região Sudeste, em articulação com governos municipais.
      Sobre o vínculo dos alfabetizadores e alfabetizadoras com o programa, merece destaque o caráter temporário em que suas atividades se realizariam, visto que a cada 6 meses estes deveriam ser mudados, e o pagamento de seus salários deveria se dar sob a forma de bolsas, que representavam valores inferiores aos vigentes no mercado. Um coordenador recebia R$ 300,00, um alfabetizador do projeto nacional recebia R$ 120,00 e um alfabetizador de grandes centros urbanos recebia R$200,00 (BARREYRO, 2006). Quanto ao custo por aluno, este era da ordem de R$ 34,00 por mês.
      Citado como um estímulo para as pessoas cuja função seria alfabetizar os analfabetos, e sob o argumento de ampliar a integração com pessoas de centros mais desenvolvidos, o que possibilitaria também a ampliação de conhecimentos, o Programa Alfabetização Solidária previa a realização de viagens às cidades que sediavam as IES nele envolvidas.
      Este formato propiciou muitas críticas ao Programa Alfabetização Solidária, inclusive por setores estatais e pelas IES que nele estiveram envolvidas. O Tribunal de Contas da União (TCU), em avaliação publicada em 2003, apontava que, além de ferir o princípio constitucional de que o Ensino Fundamental deveria ser oferecido pelos municípios, esta política era 

Executada de forma isolada em relação à política nacional de educação do MEC, não apresentando mecanismos que assegurem a continuidade do processo educacional dos beneficiários e tampouco sua interação com as demais ações do programa (p.15).


      De fato, o isolamento de tal política não só foi uma demonstração da não prioridade concedida por tal governo à questão do analfabetismo no Brasil, como também sedimentou o descumprimento de direitos garantidos na Constituição Federal, em cujo artigo 208 previa a “garantia de ensino fundamental obrigatório e gratuito assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos que a ele não tiveram acesso na idade própria”, e na LDB 9394/96, ao não oferecer tal modalidade de ensino e transferindo esta responsabilidade para entidades filantrópicas e não governamentais.
      A situação foi agravada pela exclusão da Educação de Jovens e Adultos (EJA) do ensino regular, quando da criação do Fundo de Desenvolvimento do Ensino Fundamental (FUNDEF), regulamentado pela Lei 9424/96, e que destinava 60% dos recursos destinados à educação, a estados e municípios de acordo com a quantidade de matrículas, dando prioridade às pessoas na faixa etária de 7 a 14 anos.
      Neste sentido, exemplar foi a campanha Adote um Analfabeto, que convocava “cidadãos solidários” a realizarem doações na rede bancária com cartão de crédito. Deste modo, presenciamos a negação do direito à educação ser transformada em uma prática filantrópica, além de sugerir uma relação vertical entre quem adota e financia o analfabeto e a pessoa adotada. O desaparecimento do sujeito que tem direitos produziu a emergência da pessoa inferiorizada pela condição de não saber ler e escrever, o não sujeito.
      Ainda de acordo com o referido relatório de TCU (2003), 

O módulo de alfabetização, com duração de 5 meses, sendo quatro aulas por semana, com carga horária média/dia de 3 horas, não assegura que o aluno tenha sido alfabetizado, pois a alfabetização é apenas o início de todo um processo de aprendizagem propiciado pela continuidade dos estudos (p.16).


      A fim de ilustrar tal afirmação, o relatório apresenta os seguintes dados relativos ao módulo executado entre os meses de julho e dezembro de 2000: 12% dos alfabetizandos ao final do módulo não escreve, 34% produz palavras, 30% produz frases isoladas e 24% produz textos.
      Parece-nos que o Programa Alfabetização Solidária muito mais visou o estímulo às ações voluntárias e filantrópicas, na tentativa de mobilizar a sociedade pelo convencimento de que estava na hora da sociedade abandonar a ideia de que o Estado deveria tutelar, sozinho, as vítimas do mal do analfabetismo.
      Estava embutida neste programa a orientação de minimizar a intervenção do Estado para o tratamento da pobreza e das suas expressões pela redução dos gastos, questão central ao projeto neoliberal em implantação.
      Acompanhou a mesma lógica o flagrante processo de precarização do emprego dos alfabetizadores e alfabetizadoras, cujo direito à contratação pela legislação trabalhista lhes foi negado, resultando no barateamento da utilização da mão de obra sem vínculo empregatício. De acordo com Barreyro (2006), “em 2002, em um município da grande São Paulo, o professor de uma sala de EJA recebia por volta de R$ 1.000,00, enquanto que o alfabetizador R$ 200,00” (p.8).
      Segundo argumento dos formuladores do referido programa, em resposta às críticas recebidas por este tipo de contratação, esta rotatividade favoreceria: I – a participação de um maior número de pessoas com emprego temporário, o que atingiria um maior número de jovens com necessidade de obter uma primeira experiência profissional; II- atenderia um maior número de pessoas a serem beneficiadas com capacitação (apesar de existir também o Programa Capacitação Solidária).
      De acordo com dados de Censos Demográficos do IBGE, entre os anos de 1991 e 2000, houve uma redução de 2 milhões e 387 mil analfabetos no Brasil, o que refuta a informação fornecida sobre o impacto do Programa Alfabetização Solidária nos dados sobre analfabetismo, de que “desde sua implantação até o ano 2001, mais de 2,4 milhões de jovens e adultos brasileiros foram beneficiados” (ESTEVES, 2001, p.01).
      Perguntamos então: quando se fala em pessoas atendidas, atingidas ou beneficiadas pelo citado programa está-se falando em pessoas que foram efetivamente alfabetizadas?
      Mesmo que a proposta indicada por tal programa não fosse a de superar o analfabetismo, podemos com segurança duvidar da afirmação anteriormente transcrita. A não ser que, quando se refere à população atingida pelo Programa, esta inclua as matrículas iniciais sem computar o quantitativo de abandono de aluno (que é elevado nas turmas de EJA) e de alunos não alfabetizados.
      Admitimos também que o foco de atenção do Programa não é de modo algum o controle do analfabetismo. Ele contempla as parcerias estabelecidas em maior grau que nos próprios alfabetizandos. Isto porque ao serem listados os parceiros desta iniciativa educacional – Instituições de Ensino Superior, empresas, instituições financeiras, fundações corporativas, cidadãos solidários, ONGs, governo federal, agências de fomento, empresas públicas, governos estaduais e administração municipal – ressalta-se que “é cada vez maior a disposição do setor privado em cumprir seu papel no compromisso de construir um país melhor” (Ibid., p.4).
      Melhor para os reais beneficiários do Programa – os empresários cidadãos, as ONGs cidadãs – que receberam a injeção de vultosas quantias provenientes do governo federal, principalmente nos dois últimos anos de governo de FHC, como revelam os dados fornecidos na tabela que segue.


Tabela 1 Recursos do Governo Federal para o
Programa Alfabetização Solidária (3)
2000-2004
Ano
Recursos recebidos em Reais (R$)
2000
24.302.000,00
2001
79.333.638,00
2002
107.000.000,00
2003
30.000.000,00
2004
12.000.000,00
                                                Fonte: Barreyro (2006, p.5)


      Curioso nesta tabela é observarmos o quanto de recursos foi repassado para as instituições envolvidas no Programa Alfabetização Solidária. Além dos demais benefícios anteriormente citados, como isenção de impostos.
      O governo central, sob o discurso de reduzir custos e minimizar sua intervenção em setores publicizados, agiu com generosidade para com os parceiros privados e com parcimônia para com as massas trabalhadoras analfabetas, cujo custo por aluno, como anteriormente exposto, foi irrisório. Mesmo criando a falsa expectativa de que ao atender analfabetos, estes viriam a ser beneficiados com uma melhoria na sua qualidade de vida, pois, segundo a compreensão expressa pelo programa em foco, ao setor privado caberia a competência de construir o proclamado desenvolvimento do país.
      Esta afirmação pode ser demonstrada a partir do explicitado por Esteves (2002), segundo a qual “é cada vez maior a disposição do setor privado em cumprir seu papel social no compromisso de construir um país melhor” (p.4). Continua a autora afirmando que “mais de 50% das empresas parceiras do Programa são dos grandes centros urbanos do Sudeste do país e o município adotado está em um Brasil regional, social e economicamente distante” (p.7).
      Portanto, parece-nos incoerente com as características apontadas acerca do neoliberalismo, uma suposta inclinação dos capitalistas participantes deste programa em conferir, repetimos, uma melhoria das condições de vida das maiorias dominadas e exploradas econômica, social e politicamente.
     Podemos observar que a despeito da fase em que o capitalismo no Brasil se enquadre, o tratamento do analfabetismo é fixado no interior da escola, como se tal fosse produto exclusivo do supostamente ineficiente (para os seus usuários e eficiente para a reprodução da ordem do capital) sistema escolar brasileiro.
      Ou seja, não se articula a forma como a escola é organizada em seus saberes transmitidos, sua organização serial e curricular e a própria formação dos educadores, como expressão legítima da lógica que nutre e reproduz a sociabilidade capitalista como um todo.
      Daí inferirmos que a escola capitalista – especialmente a escola pública - é um instrumento de sustentação ideológica deste modo de produção, ao mesmo tempo em que fornece parâmetros mínimos para uma qualificação subalterna da mão de obra trabalhadora. Portanto, gerar analfabetos deve ser um dos seus papéis. Ou garantir patamares mínimos de escolarização que, parece-nos, remete à mesma tragédia.
      Talvez pareça um contrassenso afirmar que a escola pública produza analfabetos. No entanto, duas questões podem ser destacadas de modo a conferir fundamento a tal afirmação. A primeira diz respeito ao processo de universalização do acesso à escola pública iniciado nos primeiros anos da década de 1970, e que no governo do presidente Fernando Henrique Cardoso alcançou percentuais superiores aos 95% com relação aos anos iniciais do ensino fundamental. Portanto, não é acertado dizer que no limiar do século XX para o XXI, as pessoas analfabetas sejam aquelas que não tiveram acesso a oportunidades de escolarização na idade certa. Estas pessoas frequentaram a escola e dela foram afastadas sem que lhes fosse garantida sequer a alfabetização.
      Além disso, no Brasil, os trabalhadores e as trabalhadoras analfabetas têm espaço no mercado, tanto para constituir um exército de reserva estagnado, como para desempenhar funções lucrativas para os capitalistas e que não exigem escolarização como, por exemplo, na coleta de resíduos sólidos. Acresce-se a estas questões o fato de que reproduzir a força de trabalho de pessoas analfabetas demanda baixo custo.
      Por fim, não desconhecemos a força desta ofensiva capitalista e a facilidade como o neoliberalismo agrega setores que se encantaram com o canto da sereia do individualismo, do enriquecimento, do estranhar-se em relação aos que são explorados, aos que são analfabetizados como forma de sedimentar desigualdades que, se ainda hoje são justificadas como naturais, têm na provisoriedade, característica de tudo o que é sólido, o germe da sua própria destruição.

REFERÊNCIAS

1. BARREYRO, Gladys Beatriz. Programa Alfabetização Solidária: terceirização no contexto da reforma do Estado. In: REUNIÃO ANUAL DA ANPED, 29, 2006, Caxambu. Educação, cultura e conhecimento na contemporaneidade: desafios e compromissos. Disponível em: http://www.anped.org.br/reunioes/29ra/trabalhos/trabalho/GT18-2586--int.pdf.
2. BENJAMIM, César. As opções do governo Lula: desdobramentos econômicos, políticos e sociais. Recife, 2004. Conferência proferida em 18 mai. 2004, CCSA/UFPE.
3. BRASIL. Lei Nº 9790 – de 23 de março de 1999. Dispõe sobre a qualificação de pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, como Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público, institui e disciplina o Termo de Parceria, e dá outras providências. Presidência da República. Disponível em: http://lei.adv.br/9790-99.htm.
4. ______. Lei Nº 9424 – de 24 de dezembro de 1996. Dispõe sobre o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério. Presidência da República. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/lei9424.pdf.
5. ______. Presidência da República. Câmara da Reforma do Estado. Plano diretor da reforma do aparelho do Estado. Brasília, 1995. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/publi_04/COLECAO/PLANDI.HTM.
6. ______. Tribunal de Contas da União. Avaliação do TCU sobre a Alfabetização Solidária de jovens e adultos. Relator: Ministro Guilherme Palmeira. 2007. Disponível em: http://www2.tcu.gov.br/psl/portal/docs/PAGE/TCU/PUBLICACOES/LISTAPUBLICACOES/SUMARIOS_EXECUTIVOS_12.PDF.
7. ESTEVES, Regina Célia Vasconcelos. Alfabetização Solidária: uma estratégia de sucesso para a educação de jovens e adultos no Brasil. In: VII Congreso Internacional de CLAD Sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública. Lisboa, 2002. Disponível em: .
8. MÉSZÁROS, Ístvan. A globalização capitalista é nefasta. Brasil de Fato, 9 ago. 2004. Entrevista a Motta, Débora & Jakobskind, Mário. Disponível em: http://www.brasildefato.com.br/v01/agencia/entrevistas.
9. MONTAÑO, Carlos. Terceiro setor e questão social: crítica ao padrão emergente de intervenção social. São Paulo: Cortez, 2002.
10. MOTA, Ana Elizabete. Cultura da crise e seguridade social: um estudo sobre as tendências da previdência e da assistência social brasileira nos anos 80 e 90. 2.ed. São Paulo: Cortez, 2000. 248p.
11. PEREIRA, Luiz Carlos Bresser; GRAU, N. Cunill (Org.). O público não estatal na reforma de Estado. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas; CLAD, 1998.

NOTAS
1- Informação verbal fornecida por César Benjamim em palestra proferida no Centro de Ciências Sociais Aplicadas da UFPE, em 18 /05/2004, sobre o tema “As opções do governo Lula: desdobramentos econômicos, políticos e sociais”.
2- Informação fornecida por Maria Carmelita Yasbek, em palestra realizada no auditório do Centro de Ciências Sociais Aplicadas da Universidade Federal de Pernambuco, em julho de 2003.
3- De acordo com Barreyro (2006), os dados relativos aos anos de 2000 e 2001 foram fornecidos pelo TCU, os do ano 2002 foram divulgados pelo MEC e os dos anos 2003 e 2004 foram publicados no jornal Folha de São Paulo, em 09/09/2004.